quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Respeito à Individualidade - Essencial, Natural e Não Faz Mal.

Sejamos diretos: você é um reaça. Sim, reacionário, sendo bem francos. Reaça mesmo. Tem sérias dificuldades em respeitar a opinião e a liberdade alheias, e acredita sinceramente que não pode haver visão de mundo melhor do que a sua. Toma por missão impor seu sistema de crenças e valores, pois no fundo faz questão que todos sigam seu sistema para que não possa surgir um melhor - o que obrigaria você a reconhecer que suas crenças e valores não eram assim tão perfeitos.

Impôr sua vontade aos outros parece divertido, certo? Só para você...

Mas não se envergonhe tanto - um pouco sim, mas não tanto. Parece que você é maioria hoje em dia. Não lhe exime de culpa pelo que você e os seus fazem com o mundo, mas ao menos divide a culpa entre todos. É provável que sempre tenham sido maioria, mas muitos permaneciam meio adormecidos, sem muita vontade de se envolver. Foi quando seres de espírito livre e entusiastas do livre pensamento começaram a se articular pelo mundo que essa maioria adormecida acordou assustada. Fazendo jus a seu rótulo, levantam-se em reação a um sopro de mudança que recém começava a ganhar força.

Quanto mais se pensa a respeito, mais curioso parece esse comportamento de querer interferir na vida dos outros, ditar regras, proibir, obrigar. Há um aspecto religioso inegável aí, senão direto, ao menos uma herança recente do pensamento típico de nove entre dez religiões do mundo: a necessidade de promover seu estilo de vida sobre os outros, como uma obrigação moral de fazer o mundo funcionar como você acha que deve. Afinal, ao íntegro não se permite conviver com o ímpio.

Mas a religiosidade está em queda, a postura reaça não. Há outros ingredientes. Intolerância talvez: "O que é diferente não pode ser bom e, além disso, me ameaça". Ignorância com certeza: "não sei o que é isso e não quero saber, não entendo e fico com raiva de quem entende". E possivelmente algo de competição: "a visão do outro não pode ser melhor que a minha, e seu estilo de vida não pode ser melhor que o meu, então nem tente, espertinho". Não interessa se o outro não está competindo com ninguém. Para você reaça, o que importa é o seu ponto de vista. Mas não se ofenda se eu insinuo que você é ignorante ou intolerante, encare isso de frente e prove que estou errado.

Claro que você tem direito a seu ponto de vista tanto quanto qualquer outro, e claro que você pode ter razão em muitas coisas enquanto outros não têm. O problema é essa sua idéia de que o mundo é dual, e esse raciocínio linear de que o que não é bom só pode ser ruim, o que não está certo é errado. A realidade é um pouco mais complexa do que isso. Não há uma resposta certa em um problema que afete várias pessoas, já que as pessoas são diferentes e precisam de soluções diferentes, e uma solução coletiva, para ser válida, deve sofrer um processo de composição e, sempre que possível, consenso. Ou seja, ninguém está propriamente certo ou errado.

Livres de preconceitos, os indivíduos tendem a alcançar consenso em todos os seus problemas comuns, sem prejuízo de sua individualidade.


Não é tão difícil quanto você pensa. Na grande maioria dos problemas coletivos, as soluções convergem naturalmente para um consenso, uma solução composta que provavelmente será melhor que as idéias iniciais que a geraram. Problemas coletivos são essencialmente práticos e as soluções necessárias são essencialmente técnicas. Não havendo preconceitos e reservas morais, resta equacionar as diferentes necessidades e preferências envolvidas para que todas sejam atendidas na mesma medida. E se todos se dedicassem em tempo e energia para essas questões práticas, muitas delas seriam resolvidas em pouco tempo.

O caso é que você e os seus não conseguem se ater a questões práticas. Dispersam sua energia - e a dos outros - envolvendo-se em tudo aquilo que não lhes diz respeito: o que os outros fazem ou deixam de fazer, como relacionam-se entre si, o que fazem com seu corpo. Não, você não é obrigado a concordar com nada que os outros façam, mas talvez eles também não sejam obrigados a pedir sua concordância. Invadiram seu espaço de alguma maneira? Isso é um problema. Mas se ninguém invadiu seu espaço e mesmo assim você mete o bedelho, bem, então você é que está invadindo. Tão errado quanto, ou talvez pior. Nunca julgue ou condene por antecipação. As pessoas devem responder por seus atos, não por suas preferências. Não conclua que um determinado comportamento ou estilo de vida vai levar a algum tipo de falta ou transgressão, essa relação pode fazer sentido para você, mas não para os outros. Lembrando: as pessoas são diferentes.

Sabe o mais engraçado? No fundo você gostaria de se relacionar melhor com as pessoas, com sua comunidade, com o mundo, e poderia fazer isso facilmente, respeitando cada indivíduo em seu devido espaço e buscando sempre uma convivência harmônica e construtiva, tanto em idéias como em ações. Mas prefere oferecer aos outros seu preconceito e sua intolerância, e aí estraga tudo. Bem, na verdade não é engraçado.

Não sinta-se ofendido ou provocado a uma briga. Sinta-se intimado a uma reflexão saudável sobre a forma como se relaciona com o mundo e com as diferenças entre indivíduos. Sua idéia de mundo perfeito é absurda, pois não adianta ele ser bom só para você. Claro, deve servir também para você, o que significa que os outros devem respeitar seu espaço e suas preferências. Mas não espere que lhe dêem o exemplo, faça isso você também.

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